O Treino de Abdominais (por Rui Marques)

O GRANDE OBJECTIVO
Todos gostaríamos de possuir uma parede abdominal forte, consistente e bem definida. Esta constitui-se como o claro sintoma de um corpo musculado e liberto de gordura corporal excessiva, indiciando uma boa saúde e condição física. Infelizmente, a parede abdominal é o local preferencial de deposição de gordura.


Neste artigo abordaremos em primeiro lugar o problema da gordura corporal excessiva e depois focaremos os aspectos metodológicos do seu treino no sentido de se alcançar uma parede abdominal bem definida, curta e forte.


O PROBLEMA: EXCESSO DE TECIDO ADIPOSO

No senso comum, é frequente a ideia de que para se possuir uma parede abdominal bem delineada e musculada há necessidade de realizar uma grande quantidade e variedade de exercícios que solicitam os músculos constituintes desta zona. Na realidade, tal não constitui mais do que uma parte do problema. Para quê realizar quatrocentos abdominais por dia se aqueles músculos estiverem cobertos por um manto de gordura. Nada mais certo do que a afirmação de Phillips “o verdadeiro segredo para uma parede abdominal forte e bem definida é, antes de mais, perder gordura corporal. A quantidade de séries e repetições de sit-ups, crunches ou leg lifts efectuadas é irrelevante se, paralelamente, não estiver a fazer algo para perder tecido adiposo, nunca verá qualquer diferença. É preciso queimar gordura E trabalhar a parede abdominal.”

Para que se possam ver os músculos abdominais é necessário que a percentagem de gordura corporal se situe cerca dos 6% a 8% (valores para o homem) ou 15% a 18% (mulher). Se actualmente o seu nível de massa gorda ultrapassa os 10% (homem) ou 20% (mulher) o primeiro objectivo deve ser perder gordura. No entanto, é preciso ter consciência de que apesar de qualquer um poder conseguir melhorias significativas nesta zona nem todos temos um potencial genético que nos permita conseguir uns abdominais como aqueles esculpidos por Michelangelo.


Mas, atenção, enquanto não se livrar da gordura em excesso nunca poderá saber sequer como é a estrutura da musculatura abdominal que possui.


CONTROLO CALÓRICO

O modo mais efectivo para perder gordura corporal é mediante o controlo rigoroso da ingestão calórica e pelo aumento da gasto calórico não só no decurso da actividade física mas também no dia-a-dia. É preciso profundar mais esta questão começando por referir que grande parte das pessoas que optam por uma dieta típica ou milagrosa acabam por perder gordura e músculo em iguais proporções e uma severa restrição calórica não é a resposta a esta questão.


E se julgam que é necessário utilizar qualquer tipo de droga para conseguir uma grande definição muscular, acreditem que a resposta é NÃO! A primeira coisa a fazer para conseguir abdominais fortes, definidos e consistentes é aferir o intake calórico (n.d.r. existem outros artigos neste blog sobre este tema específico) e manter um rigoroso controlo deste para consumir a máxima variedade de nutrientes sem exceder o máximo intake calórico.

ASPECTOS ANATÓMICOS

A parede antero-lateral do abdómen (normalmente designada de "parede abdominal" ou simplesmente "abdominais" ou "core") assume especial relevo numa multiplicidade de funções e devido à variedade de exercícios que se utilizam para o seu desenvolvimento. De uma forma simplista, o abdominal divide-se em grande recto superior (n.d.r. parte superior do abdominal), grande recto inferior (n.d.r. parte inferior do abdominal) e oblíquos (n.d.r. lateral do abdominal).


O TREINO DE ABDOMINAIS

Os abdominais são um dos grupos que gera maior controvérsia relativamente ao modo com devem ser treinados. Se perguntarmos a 10 “experts” como se devem treinar os abdominais obteremos 10 respostas diferentes. Na realidade alguns defendem que este grupo muscular deve ser trabalhado como qualquer outro ao passo que outros sustentam que os abdominais devem ser trabalhados com altas repetições e metodologia específica.


REPETIÇÕES

Julgamos que o número de repetições adequado se situará entre as 15 e as 30, o que - mesmo para indivíduos treinados - não é pouco se os exercícios forem realizados de um modo lento e controlado, fixando sempre a bacia em retroversão (n.d.r. lombar "colado" ao chão) e tentando efectuar uma contracção bem forte e efectiva em cada momento.


Em cada repetição deve chegar-se à contracção máxima, o que está dependente de uma forte conexão entre a componente física e mental do movimento (é preciso “sentir” e não só “fazer”), factor crítico para o desenvolvimento de qualquer grupo músculo. A concentração marca a diferença entre repetições com efeitos ao nível do desenvolvimento e repetições desperdiçadas.


VELOCIDADE

No que concerne à velocidade de execução os exercícios abdominais devem ser realizados com uma velocidade moderada, de forma a permitir o controlo constante da correcta posição da bacia e coluna lombar.


De facto, o aumento da velocidade de execução dos exercícios abdominais provoca fortes deturpações na técnica de execução, favorecendo o aproveitamento do “continuum” do movimento (menor esforço muscular) e a intervenção dos flexores da coxa e, por consequência, a tendência para anteversão da bacia (n.d.r. "descolar" os lombares do chão) e aumento da lordose na coluna lombar.


SÉRIES

Em relação ao número de séries a realizar pensamos que 2 a 4 séries para cada uma das 3 regiões da parede abdominal (inferior, superior e oblíquos), com um intervalo de repouso de 30 a 60 segundos, é mais do que suficiente para um treino efectivo e profícuo.


Mas de uma forma geral, faça tanto quanto puder, tanto quanto entender que precisa, mas mantenha a intensidade alta em cada repetição e não se preocupe com grandes volumes de treino, isto é, aproveite ao máximo cada repetição independentemente da quantidade alcançada.


É melhor treinar com repetições intensas e pouco amplas do que arrastar a série por longos
períodos. A chave para o sucesso está na intensidade de cada repetição.


SEQUÊNCIA DE TREINO

A integração dos exercícios para a parede abdominal na sequência de treino constitui-se como mais um factor onde existem diversas opiniões. Alguns acham que devem ser treinados no início quando ainda estão "frescos" e fortes, outros acham que devem ser treinados no final para não cansar outros músculos mais importantes para o treino.


Indivíduos numa fase inicial de treino, com uma parede abdominal fraca, deverão efectuar os “abdominais” no início do circuito de treino de força, dado que no final do treino estarão demasiadamente cansados, hipotecando o trabalho do grupo muscular mais importante para si.


Indivíduos numa fase avançada de treino, realizando cada exercício e cada série com cargas bastantes elevadas e máxima intensidade deverão trabalhar a parede abdominal na fase final da sessão de treino, pois os abdominais são fortemente solicitados no sentido da manutenção de posturas correctas.


Para indivíduos com uma parede abdominal fraca pode haver necessidade de intercalar exercícios abdominais com outros para grupos musculares diferentes, no sentido de potenciar o trabalho abdominal, já que para estes realizar 6 a 8 séries consecutivas de exercícios para esta zona poderá não se revelar produtivo ou, mesmo, possível.


SEQUÊNCIA DE EXERCÍCIOS

Dentro do próprio trabalho específico para a parede abdominal é importante respeitar uma sequência adequada na realização dos exercícios. Assim, a região infra-umbilical da parede abdominal (n.d.r. abdominais inferiores) deve ser trabalhada primeiro na medida em que quando se trabalha a parte inferior do grande recto abdominal as partes superior e média actuam como estabilizadoras, ao passo que quando se trabalha a parte superior esta actua isoladamente não
necessitando de uma ajuda muito forte da parte inferior.


Ora, ao efectuar primeiro “crunches” (parte superior) e depois “leg raises” (parte inferior) estaremos a realizar o segundo exercício já com fadiga forte da porção supra-umbilical, sendo este facto que condiciona a continuação da execução do exercício e não a exaustão da porção infra-umbilical conforme desejado. Por consequência, tivemos um trabalho demasiado intenso para a parte superior e um trabalho quase nulo para a parte inferior.


PERIODICIDADE DE TREINO

Relativamente a periodicidade com que se deve treinar abdominais, 3 a 4 vezes por semana constitui um estímulo de treino suficientemente forte para que possa haver uma evolução considerável, respeitando o período de repouso de 48 horas para que o músculo recupere e esteja novamente em condições de trabalhar em condições optimais.


Ainda assim, os abdominais são músculos que facilmente se adaptam a qualquer tipo de trabalho pelo que sabemos que os podemos treinar mais do que qualquer outro grupo muscular sem problema de sobretreino.


VARIEDADE E ADAPTAÇÃO

Outro factor relacionado com o potencial adaptativo dos abdominais ao treino é a necessidade de variar com alguma frequência a rotina de exercícios abdominais já que estes músculos se habituam rapidamente a determinado tipo de movimento, constituindo este um estímulo com um efeito de treino cada vez menos significativo.


A RESPIRAÇÃO

A execução do exercício em apneia, isto é, com bloqueio respiratório, se bem que vantajoso do ponto de vista mecânico, dado que transforma a grelha costal num ponto fixo adicional, tornando mais confortável o desenvolvimento da força de contracção dos músculos abdominais, é desaconselhável. De facto, do ponto de vista fisiológico é prejudicial por provocar um aumento da pressão intratorácica, dificultando a adaptação cardiocirculatória ao esforço, principalmente por diminuição do retorno venoso ao coração e consequente aumento da frequência cardíaca e pressão arterial.


A manutenção de um ritmo respiratório igual ao do exercício facilita a tarefa de comando do sistema nervoso ao controlar melhor o trabalho abdominal e respiratório. Os abdominais participam na expiração forçada e ao expirarmos durante a flexão do tronco reforçamos a sua contracção.


As expirações devem ser profundas e as inspirações de pequena intensidade. Sendo os abdominais potentes músculos expiratórios quando realizamos uma expiração profunda estamos a contraí-los profundamente.


PLANO DE TREINO DE ABDOMINAIS

Terminamos com um exemplo de um treino de abdominais, de intensidade e dificuldade elevada. Se pretende um treino mais moderado, fale com o seu Instrutor para efectuar as respectivas adaptações.


EXERCÍCIO - REVERSE CRUNCHES
Músculo - Parte inferior do abdominal (grande recto)
Número de repetições - até à exaustão (com forma excelente)
Número de séries - 2 a 3
Repouso entre séries - 30 segs

EXERCÍCIO - CRUNCHES COM PERNAS NA VERTICAL
Músculo - Parte superior do abdominal (grande recto)
Número de repetições - até à exaustão (com forma excelente)
Número de séries - 2 a 4
Repouso entre séries - 30 segs

EXERCÍCIO - CRUNCHES COM ROTAÇÃO
Músculo - Oblíquos
Número de repetições - até à exaustão (com forma excelente)
Número de séries - 2 a 4
Repouso entre séries - 30 segs

Kia Kaha !
Rui Marques
("O Treino de Abdominais" de Rui Marques - adaptado por Pedro Miguel para o TRIBORPM, 2009)